quinta-feira, junho 21, 2001

Café e cigarros

Eu vou largar essa porra desse trabalho. Já me disse isso tantas e tantas vezes mas raras foram as ocasiões em que me senti tão tentado a levantar dessa cadeira e virar pra minha chefe: "Cansei. To indo embora." Ligar o foda-se. A catarse final. Eu fantasio com o dia em que direi pra ela no meio de um esporro: "Pega esse salário e enfia no cu. Tá me dando esporro? Senta esse teu rabo velho nessa merda de cadeira por nove horas seguidas e vem fazer você."

Ah, as prestações do conserto do meu carro e do computador....ainda bem que contraí dívidas, ou já teria feito esse tipo de merda impensada antes. Eu preciso disso. Eu penso demais. Em tudo, em cada decisão. Deve ser maravilhoso simplesmente fazer o que se está afim e cagar pro futuro. É o que eu quero. Mandar tudo às favas. Fodam-se. Eu vou largar essa porra de emprego. Espera só acabarem as prestações. Eu juro. Nada melhor para manter a sanidade em dia do que uma dívida.

Todo escritório tem que ter gatinhas trabalhando nele. É a única coisa capaz de enfeitar esse tipo de ambiente. Não adianta botar florzinha em vasinho e fotinho no computador. Escritórios são uma merda. E tem gente que reclama de quarto de hotel....eu só fico aqui ouvindo o barulho dos teclados e a maldita televisão ligada na Globonews o dia inteiro. Ah as gatinhas...não que eu tivesse chance com alguma, mas só de olhá-las as coisas parecem fazer um pouquinho mais de sentido...como uma paisagem num ônibus que faz você esquecer do trânsito, do barulho, da muvuca. O Aterro sempre funciona assim na volta do trabalho. Só eu mesmo para achar o Aterro bonito. De noite ele é.

Sim sim onde estão elas? As gatinhas ficam tão longe.....e eu, aqui, de frente pra um jornalista coroa de dentes amarelados de café e cigarros.

Ao meu lado, a jovem-guarda da redação toma cafezinho, depois de ter fumado um cigarro no corredor.