quinta-feira, junho 13, 2002

Relicário

Há algo de especial no perfume das mulheres.

São sempre eles que eu reconheço, que não esqueço. Que as identificam.

Há algo de marcante.

Hoje eu fui dormir tarde com seu perfume em minhas roupas. No meu corpo. Um perfume tão presente que já se faz familiar e que se impregnou em mim lenta e imperceptivelmente.

Esse perfume já não é só seu.

É meu também. E ele já não é mais o mesmo. Misturou-se ao meu de tal forma que já não podemos dizer onde um começa e outro termina.

Eu hoje percebi que não sou mais apenas eu.

Percebi que agora antes de realizar meus atos, minhas vontades, minhas conseqüências eu já não penso apenas em mim. Nem poderia.

Minha voz e pensamento ecoam em outros ouvidos e mente. Minha dor fere outro peito. Minha alegria traz outro sorriso.

Eu e ela já não somos mais apenas nós dois.

Já não vivemos apenas por nós dois.

E, ao contrário do que possa parecer inicialmente, não me sinto mais preso, com mais responsabilidades, mais preocupado.

Sinto-me mais leve, pois agora são dois a segurar o fardo de certos dias. Pois agora tenho com quem dividir o que antes carregava sozinho.

Cada um de nós é dois. É os dois.

Nos mesclamos e arraigamos lenta e imperceptivelmente e já não sabemos onde um acaba e o outro termina.

Como o seu perfume, que também é o meu. Que é o nosso.

Perfumes que deram origem a um novo e único.

E que dorme essa noite em minhas roupas

trazendo a lembrança dela.

E me fazendo deitar muito mais tranqüilo.