segunda-feira, fevereiro 18, 2002

Ipanema Noir

Acabou o carnaval. Ipanema entardece no horário de verão.

Após um mergulho no mar me sento na areia e observo o sol se por. Depois de tantas noites sem sono, finalmente me sinto quieto e calmo.

É só uma imagem banal, de um dia qualquer.

Mas não me sinto sozinho. Ou, pelo menos, não penso nisso agora.

Não penso nesse verão, nesse carnaval.

Inesquecíveis. Mas eu me esforço.

Eu queria por tudo isso no papel. Um roteiro de um filme. Sobre quatro homens de vinte e poucos anos. Sobrevivendo num período de dúvida, de solidão, de descoberta e despedida. Apenas quatro caras, quatro moleques. Dando um passo na frente do outro e vendo onde isso vai dar, onde vai acabar.

Eu queria mostrar nesse roteiro que há, sim, como se sentir entediado e sozinho numa cidade como essa. Com praias como essa. Com garotas de biquíni como essas.

É possível, se você quer algo a mais.

Eu queria descrever todo esse processo de amadurecimento e aprendizado. Quatro amigos diferentes entre si reagindo a seu modo a coisas que, não tenho certeza (mas realmente acho), só acontecem nesse momento da vida.

As noites sem rumo, as letras de músicas, os sentimentos desperdiçados. As conversas e conselhos. A incerteza profissional.

Apenas moleques. Levando porrada.

Se há algo positivo na tristeza que andamos carregando por esses dias é o fato de podermos contar uns com os outros. De ver que não é tão estranho assim se sentir incompleto.

Que não há vergonha em deixar os sentimentos aflorarem. Em parar de se enganar.

Todo mundo é frágil, vez ou outra. E todo mundo precisa de alguém.

Por mais diferentes que sejamos à primeira vista.

Deve ser coisa da idade.

Esse foi o pior e o melhor verão da minha vida.

Por mais que tenhamos sofrido, por mais que tenhamos ficado mal muitas vezes, eu não mudaria nada.

Eu prefiro algo inesquecível a algo medíocre.

Esses dias não passarão em branco. Nem pra mim nem pra vocês.

É assim que tem que ser. Não há outro meio. Só assim se aprende e se cresce.

Ah, se eu conseguisse passar tudo isso pro papel...

Não há felicidade ou tristeza. É só o que é.

A vida.

O verão de 2002.

Vai passar.

Olhando o mar eu penso que um dia vamos rir disso tudo que tanto dói. De todas essas descobertas e expectativas.

Da ingenuidade e do frescor que o tempo vai levar.

Desses longos dias de sol noturno, com seus sentimentos jogados ao vento e suas amizades que se estreitam.

Apenas quatro caras, tão diferentes.

O insensível, o confiante, o emotivo, o inseguro.

Somos todos eles.

Cada um do seu jeito.

segunda-feira, fevereiro 11, 2002

Atropelamento e fuga

Tudo que eu queria era envelhecer.

A juventude é um monstro. Alimentado por respostas rápidas, por impaciência, por uma fome avassaladora. Por um instinto muito mais forte do que a razão. Uma inexperiência que não se percebe até que se erra.

Toda essa energia, essa vitalidade, essa força e inconseqüência nos move e nos consome.

A juventude é autodestrutiva.

A gente quer tudo. Naquele momento. Não pode ser depois.

Nos ensinam a ser assim. A viver assim, comprar assim, querer assim.

Dez minutos são uma eternidade.

Você entende? Já se sentiu desse jeito?

É como dirigir um carro em alta velocidade. Sem enxergar o que se passa a sua volta, quem atravessa a rua.

Tudo se resume a uma necessidade primal e voraz de mais realizações, de mais conquistas, de mais rapidez. Um vício destrutivo e delicioso. Adrenalina, agitação, nervosismo. Tormento.

O pé cada vez mais forte no acelerador, a cabeça cada vez mais longe do bom senso e do cuidado.

Quanto mais rápido se vai, menos se percebe as coisas. Menos se pensa.

E tem momentos na vida que a última coisa que se quer é pensar.

Que se precisa não pensar.

Só se reage. Automaticamente.

Às vezes nos esquecemos de olhar um pouco adiante.

E é daí que acidentes acontecem.

Você parou por mim.

E eu, nessa ânsia ingênua, fiz o que menos desejava: passei direto por você.

Atropelando-te com as minhas dúvidas e fome por respostas.

Passei por cima de você, do que você precisava, do que você me pediu. Machuquei aos dois, te fiz ter medo. De mim.

Tive algo que busquei por muito tempo.

E joguei fora.

O que eu faço agora com essa culpa?

Eu já pensei em tanta coisa... em jogar fora minha habilitação, em nunca mais dirigir, em viver ainda mais rápido.

Mas você, talvez sem querer, me fez conhecer a mais sábia provação.

Cabe a mim agora, sempre tão afoito e impaciente, aguardar. Ver o relógio passar devagar, torturante, pelas horas e minutos. Aprendendo a ser mais cuidadoso, mais atencioso. Mais contemplativo. Valorizar o que tenho e o que perdi. Crescer. Envelhecer.

Pra mim essa distância é só um hiato.

Eu ainda quero acreditar e esperar. Não sei bem por quanto tempo. Até quando essa vontade persistir. Não porque algo me foi prometido (não foi), não porque busco uma ilusão (não busco). A razão é muito simples. Eu quero esperar. Hoje, eu quero. Por você, eu quero.

Logo eu, que já havia me convencido a não esperar por mais nada....

mas você me ensinou que desesperança é um erro. Que ainda vale a pena.

Pode apostar que eu estou aprendendo.

E saiba que o que sobrar no fim de tudo isso será alguém mais forte e mais observador.

Qualquer dia desses, se você quiser (e se eu quiser), te proponho uma carona.

Pra você ver que eu agora dirijo diferente.

Pra você ver que eu voltei a pensar. Em mim e nos outros.

E que eu não vou errar de novo o que já errei. Com você ou outra pessoa.

E levar embora o seu medo.

E o meu.

O tempo é como um jovem. Ele nunca para.

Ainda bem.

sábado, fevereiro 09, 2002

Noites Cariocas

Não lembro ao certo que dia foi. Nem como você saiu. Era madrugada e eu dormia. Pela manhã já estava tudo consumado.

E aí, sem vocês, vendo a casa sem vida e silenciosa, eu percebi.

O quanto tudo em que eu me apoiava era passageiro. E desmoronou.

Eu estou confuso sem você por aqui pra me aconselhar, me responder tantas e tantas coisas que vêm me assolando ultimamente.

Pra me dizer se existe algum remédio que leve embora toda essa dor e tristeza.

Volta logo...

Tudo passa tão devagar, se arrastando, sem cor.

Eu queria que você visse que eu dei conta de tudo certinho na tua ausência. Não fiz merda, não enlouqueci, não deixei nada transparecer para não desanimar os outros.

Do jeito que você ensinou.

Se você tivesse visto, teria ficado orgulhoso.

Mas nem tudo está bem.

Porque depois da sua partida, eu me vi preso numa solidão e num vazio imensos (que já estavam lá antes, mas que eu não enxergava), que pesam e doem a cada dia mais e mais.

Meus pensamentos estão confusos. Não sei mais o que fazer. Não consigo raciocinar mais. Está tudo sendo drenado pelo buraco negro dentro do meu peito, aumentando, aumentando, levando embora a minha alma.

A minha luz.

Se você pudesse me ouvir....

Eu percebi que tudo que eu fiz e faço é só uma maneira de escapar desse vazio, de não pensar em nada, de só agir e reagir automaticamente.

Eu ando vivendo desregrado, sem rumo, cambaleante, anestesiado, atormentado, inventando e inventando coisas pra me entreter.

Sem conseguir.

No fun......no funnnnnnn........

Eu preciso mesmo de companhia.

Pra encarar o vazio dessa casa.

E do meu peito.

Já não sei mais de nada. Tudo me parece vasto e distante.

Precisava dos teus conselhos, da tua voz ecoando pelos quartos.

Da sua alegria.

Não há mais alegria agora.

Como eu te disse, eu fiz tudo do jeito que você me ensinou.

Mas volta logo, pois eu não sei por quanto tempo consigo me manter em pé.

E fingindo.

Volta logo.

Pode ser por uns meses, ou anos. Ou dias.

Preciso de forças antes de me despedir de vez. Pra conseguir resolver tudo que eu sei que não tem nada a ver com sua ausência.

Mas que ela me fez sentir e enxergar.

Forte demais.

Volta, anda.

Eu preciso, de você, de alguém, de uma certeza.

To com saudade.

Um beijo.

domingo, fevereiro 03, 2002

A Urca

...e sete dias se seguiram....

A tarde passava arrastada no dia sem luz. Desceu sete lances de escada, no escuro.

Era chegada a hora, mais uma vez, de trilhar o velho caminho tantas vezes pisado.

Em sus velha trilha, que não visitava há tempos, já não ouvia o barulho dos carros ou da cidade grande. Apenas o canto dos pássaros e os risos dos que se banhavam em águas sujas.

Bem-vindo de volta. Eu sabia que você voltaria. Não se iluda. Aqui é o seu lugar. Onde você pertence.

Andou com passos lentos sobre o asfalto gasto, e com lágrimas nos olhos vislumbrou o mundo verde e azul. Tão imenso e tranqüilo. Como naquelas manhãs de Cabo Frio, vendo a lagoa acordar, enquanto o café no fogão dominava o ambiente.

Onde foi que deixara toda aquela paz ?

Tudo é tão belo e brilhante na pista. Tantos detalhes e pequenas visões que passam despercebidas. Você nem sente o cansaço ou o calor.

Há sempre algo de diferente na paisagem, assim como quem te levou a ali estar não ser a mesma pessoa.

Mas o sentimento, a sensação.....é tão familiar...

Nada de novo.

Tudo igual abaixo do Sol.

Pra quê se iludir, garoto? Por que não abraçar de vez o seu destino? Você só deixa o seu lar pra voltar cada vez mais envelhecido e cansado....

O velho caminho, ele sabe bem como termina, o que oferece, o quanto exaure.

Mas sempre volta. Mesmo sabendo de tudo. Mesmo sabendo que o terminará sozinho.

Pois a trilha, em seu final, não traz nenhuma grande visão, nenhum pote de ouro.

Toda a exuberância dá lugar a um grande paredão de pedra nua e deserta.

O fim.

Que não te dá opção alguma a não ser olhar para trás, virar-se para a direção de onde se veio e voltar para onde sempre se esteve.