Sossego
“...olhou para o rosto lívido e calmo. Quase infantil em sua tranqüilidade.
E, ao se encontrarem, formou-se no rosto feminino um sorriso sincero."
O abraço dela levou embora a dor.
E, com a dor, foram-se as palavras.
Por que é tão mais fácil se escrever sobre a tristeza?
Por que é tão difícil passar para o papel a sensação de alívio e paz que sentimos tão poucas vezes na vida?
Algumas pessoas resolvem seus problemas. Outras os (re)vivem eternamente, prisioneiros de seus traumas e decepções passadas, deixando o medo e as lembranças guiarem seus atos e escolhas.
Eu já fui dos dois tipos.
E, por alguma razão, sempre me foi muito mais fácil escrever sobre tristeza e decepção.
Sobre perda e saudade.
(É sempre mais fácil escrever sobre si mesmo.)
Pois se apenas sobre a solidão sei escrever, abdico, então, da literatura.
Troco tudo por mais um beijo. Pelo calor da tua respiração junto à minha. Pelo modo delicado e carinhoso com que dizes meu nome.
Eu troco todas as palavras. Todas as frases. Todas. Qualquer uma.
Deixem quieta a minha alma.
Deixem seca a minha pena. Não há tinta, por enquanto. Não pra sentenças tortuosas e densos arremates.
Deixem livre o meu espírito. Ele merece, depois de tudo, lembrar o que é paz e alívio.
Antes o vazio era eu. Agora são as folhas de papel.
Que elas fiquem assim por muito tempo.
Eu troco tudo, todos os livros, todos os textos. Todas as palavras que o abraço dela levou e parecem agora tão exageradas.
Eu troco tudo.
Por um pouco do seu sossego.